O que beber?
Por Rita Lobo - 13 de outubro de 2019
Meu avô Lobo nasceu em 1900. E isso foi um marco durante a minha infância. Se na aula de história o professor ensinava que a Segunda Guerra Mundial terminou em 1945, imediatamente pensava: o vovô Lobo tinha quarenta e cinco anos. Assim foi com todos os acontecimentos do século 20, na minha cabeça, ele estava sempre presente. Mas meu avô foi marcante para mim por muitos outros motivos, além do ano de nascimento. Era médico endocrinologista, foi uns dos fundadores da, então, Escola Paulista de Medicina, teve dez filhos com a minha avó Maria Rita, vinte e cinco netos – e, mesmo assim, eles conseguiam fazer da mesa de jantar um lugar sereno!
Ele era sério, disciplinado, magro, saudável e viveu muito bem, até morrer, em 1994 – você pode ter feito as contas –, com noventa e quatro anos.
As refeições na casa dos meus avós eram lentas e completas. Primeiro era servida uma entrada, que variava bastante no verão, mas no inverno era sempre sopa. O prato principal e os acompanhamentos vinham depois e eram colocados no aparador. A sobremesa, geralmente um pudim ou uma compota de frutas acompanhada de queijo branco, era seguida de café pelando de quente com a xícara escaldada para não esfriar. Para beber, água. Nunca vi o vovô Lobo tomar um copo de refrigerante, nem mesmo de suco. De vez em nunca, uma taça de vinho para brindar.
De certa forma, para mim, ele era a personificação de uma alimentação saudável. Comida de tudo e comia pouco.
Há algumas semanas, o Journal of the American Medical Association publicou uma pesquisa que aponta piora na saúde de quem toma bebidas adoçadas. O curioso é que tanto faz se é refrigerante, chá ou suco, mesmo os feitos de ingredientes naturais! Imediatamente pensei no meu avô. Mas me dei conta também que, desde 2017, não tomo mais suco. (Refrigerante, como você pode imaginar, nunca entrou na minha casa.)
Sei precisamente o ano que parei de tomar suco porque coincide com a publicação de Comida de Bebê. O livro é um guia sobre introdução alimentar e mostra que esse período é também uma oportunidade para melhorar a alimentação de todos na casa. A comida é a mesma! A diferença, em linhas gerais, é a textura. (Para os pais, arroz, feijão, hortaliças e carnes. Para o bebê, os mesmos alimentos, só que bem amassadinhos. E, claro, quase sem sal.) Os conceitos nutricionais desde livro são tão sólidos, tão claros, que acabaram impactando também na alimentação de todos no Panelinha. O que antes parecia um conceito abstrato, “alimentação balanceada”, para todos nós ficou claríssimo.
Conheça o projeto Comida de Bebê
Ao mesmo tempo que a introdução alimentar é um momento precioso na vida da família, é também, para os pais, um período cheio de dúvidas e até aflições. Por isso, durante mais de um ano, ficamos em contato estreito com os médicos, nutricionistas e pesquisadores do NUPENS (o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde). Era uma responsabilidade muito grande produzir um livro com orientação sobre a alimentação do bebê e eu contava muito com a consultoria nutricional e científica da equipe coordenada pelo prof. Carlos Monteiro.
Conheça a equipe de especialistas
Uma dúvida frequente das mães durante a introdução alimentar tinha a ver com as bebidas, o que oferecer para o bebê tomar. A resposta dos especialistas, além do leite materno, era: água. E só. E a explicação fez tanto sentido para mim que, naturalmente, fui deixando de tomar suco. (Minha teoria é que a consciência altera o paladar.)
Do ponto de vista histórico, as bebidas adoçadas são tão recentes na nossa alimentação que nós, seres humanos, nem temos mecanismos eficientes para detectar as calorias líquidas.
Conseguimos comer apenas uma laranja, mas somos capazes de tomar um suco de três laranjas espremidas!
Copio aqui um trechinho do livro Comida de Bebê que explica esse ponto:
“Sucos de frutas e hortaliças são líquidos com açúcares livres (frutose, glucose e sacarose), que saciam menos do que a mesma quantidade de calorias consumida na forma original dos alimentos.
Nos sucos naturais, esses açúcares ficam tão concentrados que, do ponto de vista metabólico, podem ser equivalentes às bebidas açucaradas industrializadas. Nas frutas in natura, a presença das fibras retarda a absorção desses açúcares e, mais do que isso, regula o consumo excessivo.
Quando consumidas em excesso, mesmo em sucos naturais, com todas as vitaminas que possam ter, as frutas levam ao aumento da ingestão total de açúcares indicados numa alimentação balanceada e aumentam o risco de ganho de peso.”
A orientação era específica para a fase da introdução alimentar do bebê. Mas fez sentido para mim! Desde então, tomo água, café e vinho. Bem mais, aliás, do que o meu avô Lobo tomava. Mas esse hábito puxei do meu outro avô, o Rago. Para ele, a refeição só estava completa com um copo de vinho tinto – e era um copo, mesmo, não uma taça.
Eu fico no meio do caminho: água sempre, café só até às 16h, e vinho, só no jantar. Não necessariamente em todos. Antes de dormir, especialmente no frio, tomo um chazinho.