A cozinha chegou na ciência, e também na medicina
Por Rita Lobo - 14 de julho de 2024
No último mês, fui convidada para falar em três congressos científicos: participei de uma mesa no Congresso Brasileiro de Nutrição; apresentei, em Londres, um trabalho no Congresso Mundial de Nutrição e Saúde Pública para cientistas do mundo todo; e também falei pra uma plateia de médicos e nutricionistas no Congresso Internacional de Obesidade.
O motivo de tantos convites é que, finalmente, a cozinha chegou na ciência, na saúde pública e até na medicina. Digo até na medicina porque esse é um tema muito novo. Universidades como Stanford, Tulane, nos Estados Unidos, e também Unifesp, USP e Unicamp, entre outras brasileiras, já têm em seus currículos uma nova matéria, a Medicina Culinária. Mais para frente, aqui neste post, conto melhor essa história. Mas, primeiro, vou falar brevemente sobre cada um dos congressos.
Congresso Brasileiro de Nutrição
O assunto era a nova cesta básica que, mais do que os alimentos que os trabalhadores recebem, é um instrumento que ajuda a formular políticas públicas que impactam na alimentação de todos. (Um exemplo bem recente: a taxação dos alimentos. Na votação da reforma tributária, a carne ficou isenta de impostos porque faz parte dos alimentos da cesta básica.)
A mesa que discutiu as potencialidades da nova cesta básica foi composta pela Lilian Rahal, Secretária Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (Sesan/MDS), Elisabetta Recine, Presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Renata Levy, Pesquisadora do NUPENS da Universidade de São Paulo e foi mediada pela Patrícia Gentil, diretora do Departamento de Promoção da Alimentação Adequada e Saudável. Ah, e eu.
O meu assunto, claro, era a cozinha de casa e como os alimentos da nova cesta básica, divididos em 10 grupos, ajudam a organizar a alimentação. Em primeiro lugar, porque os ultraprocessados ficaram de fora. E só isso já é uma grande vitória, porque ela é composta por alimentos de verdade. Para esses alimentos virarem refeições saborosas e saudáveis, porém, é fundamental que as pessoas saibam cozinhar. E, nesse sentido, na minha opinião, não dá para pensar em alimentação saudável ou comida de verdade (que são sinônimos), sem falar de divisão de tarefas. O planejamento, as compras, o armazenamento, o preparo, a limpeza… É muita coisa para uma única pessoa na família, que geralmente é a mulher. A alimentação deve ser um assunto da casa.
Veja como aproveitar os alimentos dos 10 grupos da nova cesta básica brasileira.
Ainda no contexto da importância da nova cesta básica, a Lilian Rahal disse que “As escolhas são individuais, mas se não proporcionarmos boas escolhas, não podemos culpar os indivíduos por escolhas ruins”, referindo-se aos ultraprocessados.
Já a Renata Levy lembrou que hoje o consumo de ultraprocessados está relacionado a trinta e dois desfechos de saúde, ou seja, mais de trinta doenças.
Congresso Mundial de Nutrição e Saúde Pública
Foi emocionante ver, em Londres, o trabalho do professor Carlos Monteiro pautando um congresso inteiro. Só se falava em ultraprocessados e no impacto negativo deles na saúde das populações. O prof. Carlos Monteiro é coordenador emérito do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP (Nupens), professor emérito da Faculdade de Saúde Pública da USP e parceiro do Panelinha.
Com a classificação de alimentos por grau de processamento, o prof. Carlos Monteiro quebrou um paradigma na nutrição.
Nesse Congresso, que é o maior na área de nutrição e saúde pública no mundo, apresentei, junto com a prof. Patrícia Jaime, que é coordenadora científica do Nupens/USP, nutricionista, pesquisadora, mestre e doutora em saúde pública e também vice-diretora da Faculdade de Saúde Pública da USP, um trabalho sobre a colaboração entre ciência e comunicação e o impacto na alimentação de milhões de pessoas.
Saiba mais sobre este trabalho:
O Panelinha e o Nupens trabalham juntos há mais de 10 anos com o propósito de divulgar conteúdos baseados em evidências científicas. O Nupens quer tirar os ultraprocessados da mesa, o Panelinha quer levar as pessoas para a cozinha. Como dizem, juntou a fome com a vontade de comer! E deu certo.
Entre outros projetos, mostrei que, para incluir mais legumes e verduras no dia a dia das pessoas, criamos o projeto 'O que tem na geladeira?'.
No projeto 'Comida de bebê', aproveitamos a janela de oportunidade da fase da introdução alimentar do bebê para introduzir a comida de verdade para a casa toda! Comida de bebê não é papinha, é pê-efinho.
Enfim, são dezenas de projetos, como o 'Cozinha a quatro mãos', a série 'Comida de verdade', um curso gratuito em 10 aulas, várias temporadas do Cozinha Prática e também a série documental 'Prato Feito Brasil', que mostra para os brasileiros que temos a nossa dieta, a dieta brasileira, que é saudável, saborosa e, na comparação com outras, é mais acessível.
Veja abaixo alguns trechos da minha apresentação no congresso:
Congresso Internacional de Obesidade
É muito difícil propor uma alimentação saudável sem que a cozinha de casa esteja funcionando a todo vapor. Esse foi o tema da minha apresentação. Mostrei também estratégias específicas para melhorar as refeições, como incluir mais hortaliças, comer arroz e feijão diariamente, reduzir o consumo de carnes, tudo que você que me acompanha já deve ter me ouvido falar inúmeras vezes.
Veja um resumão em vídeo sobre minha participação no evento:
O que nem eu conhecia mais profundamente era a Medicina Culinária. É uma nova área nas faculdades de medicina, que reforça a importância de profissionais dominarem os fundamentos da cozinha.
Médicos que conhecem os alimentos e preparam suas refeições fazem melhores escolhas e também melhores recomendações aos seus pacientes.
A apresentação da professora Ana Carolina Junqueira Vasques, da Unicamp, foi brilhante. Ela explicou que a medicina culinária está apoiada em três aspectos: princípios nutricionais, habilidades culinárias e comunicação. E tudo começa com o autocuidado do próprio profissional.
Ou seja, médicos estão aprendendo a cozinhar na faculdade para poderem cuidar melhor de si próprios e, consequentemente, dos pacientes. É o tal do faça o que eu faço! E já tem estudos mostrando que médicos que cozinham conseguem orientar melhor seus pacientes em relação à alimentação saudável.
Após três congressos, e inúmeras trocas, tenho ainda mais convicção de que estamos no caminho certo: cozinha é como ler e escrever, todo mundo deveria saber! Ninguém nasce sabendo, mas todo mundo aprende. E cozinhar é libertador! Porque nos dá autonomia, inclusive para excluir os ultraprocessados da nossa alimentação. Cozinhar é, mesmo, a estratégia mais eficiente para manter uma alimentação saudável, de verdade. E, nas famílias, para garantir comida de verdade na mesa, só com divisão de tarefas.
É tudo o que venho falando pra você ao longo desses 20 e poucos anos, não é? Sempre com muitas receitas, para mostrar na prática como é que se faz. Só que, dessa vez, falei para uma plateia de médicos, nutricionistas, profissionais da saúde e formuladores de políticas públicas. E, claro, ainda fiz um monte de selfies. :)
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