Cidade de São Francisco processa indústria de ultraprocessados: ‘Estão nos deixando doentes’

Cidade de São Francisco processa indústria de ultraprocessados: ‘Estão nos deixando doentes’
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Por Rita Lobo - 16 de dezembro de 2025


Procurador municipal explicou que ultraprocessados são viciantes e associados ao surgimento de doenças crônicas

Você deve ter visto a notícia de que a cidade de São Francisco, na Califórnia, entrou com uma ação judicial contra os principais fabricantes de ultraprocessados. E o anúncio, feito pelo procurador municipal David Chiu, foi tão bem estruturado que eu vou citar os principais pontos pra você (leia a íntegra traduzida para o português aqui!).

Ele começou explicando os ultraprocessados: “São produtos que estão nos deixando doentes, de forma clara e direta. Esses itens na nossa alimentação estão profundamente relacionados a condições graves de saúde e impõem enormes custos a milhões de americanos. Estamos falando de ‘comida’ que não é comida de verdade — não é encontrada na natureza e é criada por meio da combinação de substâncias químicas artificiais com processos industriais”.

Essa ação na Justiça usa como base a classificação de alimentos denominada NOVA. Ela foi criada aqui no Brasil, na USP, pelo núcleo do professor Carlos Monteiro, que cunhou o termo ultraprocessado.

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Vou continuar citando o procurador. “Embora alimentos ultraprocessados frequentemente tenham alto teor de sódio, açúcar adicionado e gorduras saturadas, os riscos à saúde não se limitam a calorias, gordura ou sal. Esses produtos apresentam riscos únicos, por causa dos componentes químicos que contêm, pela forma como esses químicos são combinados e pelos processos usados na sua fabricação.”

Esse é um entendimento profundo sobre o conceito de ultraprocessado. A grande diferença da classificação NOVA é que ela divide os alimentos por grau de processamento, então, ela não leva em consideração macronutrientes nem calorias.

Isso foi uma revolução no campo da nutrição, porque ajudou a ciência a desvendar a ligação entre alimentação e doenças crônicas. Na prática, quer dizer o seguinte: um pão feito em casa com farinha, sal e água não tem nada a ver com um pão feito na fábrica, que leva, além de farinha, sal e água, açúcar, óleo vegetal, emulsificantes (como mono e diglicerídeos), conservantes e também fosfato monocálcico, cloreto de amônio, ácido ascórbico e acidulante ácido cítrico. Certo?

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O que o procurador diz é que não são só esses componentes químicos que apresentam riscos à saúde, mas também os processos usados na fabricação.

A indústria, para padronizar e baratear os custos de produção, corrompe a matriz do alimento original, e o corpo não entende esse tipo de produto como alimento.

É por isso que, nos dias de hoje, é tão perigosa essa história de dizer que vai comer proteína. Dentro dessa lógica, quando o que você precisa é de proteína, tanto faz o que você vai consumir. E, pra bater a meta, provavelmente vai incluir barrinha proteica, iogurte proteico e outros ultraprocessados.

Graças à classificação NOVA, a gente aprendeu que comer uma omelete não é igual a comer um produto proteico ultraprocessado, que o corpo não entende como alimento. Aliás, vale lembrar que arroz e feijão também são fontes de proteína e por isso chamar carne de proteína é uma roubada.

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Mas vou voltar pro texto do David Chui, procurador de São Francisco.

"A indústria criou milhares de novas substâncias que o corpo metaboliza e deseja de maneira diferente. E esses produtos são projetados para serem viciantes — a dependência é uma característica, não uma falha. Nas últimas décadas, essa indústria inundou o abastecimento alimentar [...] e não existe ninguém que consiga evitá-los completamente [...]."

Os alimentos ultraprocessados criaram uma enorme crise de saúde pública, com custos de saúde disparando. À medida que o consumo desses produtos aumentou, também aumentaram as doenças crônicas [...] como: diabetes tipo 2, esteatose hepática, doenças cardíacas, doenças renais, câncer colorretal, doença de Crohn e depressão. E o impacto sobre crianças tem sido especialmente alarmante, com níveis inéditos de obesidade e de diabetes tipo 2.

E eu quero destacar mais um ponto do discurso dele, que é quando ele diz que isso não se limita ao que normalmente pensamos como “junk food”. “Muitos alimentos ultraprocessados não parecem prejudiciais, mas são falsamente divulgados como saudáveis.”

É aí que entram produtos como a barrinha de cereal, o iogurte proteico, o snack fit, o refri zero… Mesmo com embalagem dando a entender que é saudável, se for ultraprocessado é um produto cujo consumo é associado ao aumento de várias doenças crônicas.

Entendeu por que os ultraprocessados são um problema de saúde pública global?

Na prática, isso quer dizer que ficou difícil, mesmo, fazer boas escolhas e se alimentar de maneira saudável. Mas o problema não é você e sim esse sistema alimentar que foi moldado pelas grandes corporações que fabricam e comercializam ultraprocessados.

Só que a gente vai precisar almoçar, jantar e no dia seguinte tomar café da manhã, almoçar e jantar de novo. E, apesar de uma ação como essa da cidade de São Francisco sinalizar que os ventos estão mudando, a gente não pode esperar de braços cruzados o sistema alimentar mudar.

E qual é a solução? Olha, nestes 25 anos de Panelinha, a gente comprovou que quem sabe cozinhar consegue fazer melhores escolhas. Só que, hoje, isso não basta. Ler a lista de ingredientes do rótulo ajuda a identificar os ultraprocessados, pra que você possa escolher o que está comendo.

Mas tem uma outra coisa que há anos eu venho falando, e não só pra você. Foi o que eu disse no evento em Londres da revista Lancet, no Congresso de Pediatria, no Curso Avançado de Medicina da Obesidade na Unicamp, no Congresso de Cardiologia e em tantos outros congressos: alimentação não é assunto de dona de casa, é da casa. Assunto de homens, mulheres, e inclusive dos adolescentes. Sem divisão de tarefas, fica difícil garantir comida de verdade na mesa. E planejamento também ajuda.

Aqui no Panelinha tem milhares de opções de receitas, só com ingredientes de verdade.

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