Comida de verdade: nossa história e, tomara, nosso futuro

Comida de verdade: nossa história e, tomara, nosso futuro
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Por Rita Lobo - 03 de dezembro de 2025


A classificação NOVA é a peça que faltava pra que a gente pudesse ter clareza sobre alimentação e saúde –e abandonar modismos nutricionais e ultraprocessados

Nestes 25 anos de Panelinha, impactando cerca de 10 milhões de pessoas todos os meses, com o site e também nas redes sociais, eu assisti a um sem fim de modismos nutricionais.

Lá no comecinho dos anos 2000, as pessoas queriam receitas light, depois diet, depois teve a onda do sem glúten –e tudo sem nenhuma necessidade alimentar especial, porque a gente sempre perguntou muito pro público o motivo de buscarem essas receitas especificamente.

Mais recentemente, veio o lowcarb e agora tudo precisa ser hiperproteico pra bater a meta.

Durante este tempo, eu e o Panelinha ficamos firmes no propósito de melhorar a alimentação das pessoas, ensinando a cozinhar comida de verdade e, portanto, sem nos render aos modismos em troca de cliques. Mais do que isso, sem aceitar nenhum tipo de publicidade do que hoje a gente chama de indústria de ultraprocessados.

E é nesse ponto que eu queria chegar. Como a gente é brasileiro, tem uma boa noção do que é comida de verdade em função do nosso padrão alimentar tradicional, que é balanceado. O símbolo da nossa dieta brasileira é o pê-efe, o prato de arroz com feijão, legumes, verduras, carnes, ovos, uma farofinha…

Mas, mesmo assim, esse entendimento de que os modismos nutricionais não são saudáveis sempre foi um pouco na base da intuição. Até que surgiu a classificação dos alimentos por grau de processamento e mudou tudo. A classificação NOVA é a peça do quebra-cabeça que faltava pra que a gente pudesse ter clareza, inclusive, do que é comida de verdade. Ela é o extremo oposto dos ultraprocessados.

A comida de verdade é feita com alimentos in natura e minimamente processados, por mãos humanas, com métodos de cozimento tradicionais, e respeita um padrão alimentar balanceado. Mas ela incorpora novos sabores, novas ideias.

A comida de verdade é viva, porque ela é a nossa cultura, a nossa história e, tomara, nosso futuro. Ela é sinônimo de alimentação saudável.

E é tudo isso que os ultraprocessados tiram da gente. E moldam até o nosso jeito de falar. De repente, carne virou proteína. E quando o que você busca é proteína, tanto faz se é frango, feijão ou whey. Ou um iogurte proteico, ultraprocessado.

Do ponto de vista da cozinha, o aumento do consumo dos ultraprocessados é também uma questão de gênero. Pra tirar os ultraprocessados da alimentação, temos que cozinhar mais. Só que as mulheres não têm mais tempo… Opa! Mas quem disse que a mulher é quem tem que cozinhar?

Há décadas eu trabalho pra que alimentação nāo seja assunto de dona de casa, mas da casa toda. De mulheres e homens, de adultos e adolescentes. E parece que da ciência também. O motivo pelo qual eu estive no lançamento mundial da Série The Lancet – Alimentos Ultraprocessados e Saúde Humana, e estou muito honrada de também estar aqui hoje, é porque a classificação dos alimentos por grau de processamento nos mostra que cozinhar é uma ferramenta pra tirar os ultraprocessados da mesa.

E eu, depois de mais de 30 anos ensinando milhões de pessoas a cozinhar, posso afirmar que cozinhar não é dom, é um aprendizado. Ninguém nasce sabendo. É como ler e escrever. Todo mundo deveria saber. E todo mundo aprende.

* Texto que apresentei no lançamento nacional da série especial da revista médica The Lancet, em Brasília, evento de que participei a convite do Programa Mundial de Alimentos da ONU. Quem me acompanha por aqui sabe que eu estive no lançamento mundial, em Londres, dessa edição sobre ultraprocessados e a saúde humana. Aqui no Brasil, tive o privilégio de mediar o debate com representantes da OPAS/OMS, da FAO, do UNICEF e do WFP. A conversa contou também com vários cientistas, entre eles o professor Carlos Monteiro, coordenador honorário do Nupens — o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP —, que é parceiro científico do Panelinha.

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