Ação judicial de São Francisco contra os fabricantes de ultraprocessados: tradução e transcrição completa

Ação judicial de São Francisco contra os fabricantes de ultraprocessados: tradução e transcrição completa
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Por Rita Lobo - 16 de dezembro de 2025


Bom dia, meu nome é David Chiu, Sou o procurador municipal de São Francisco e quero agradecer a todos por estarem aqui hoje. Estamos aqui para anunciar um processo inédito contra os maiores fabricantes de alimentos ultraprocessados — produtos que estão nos deixando doentes, de forma clara e direta. Esses itens na nossa alimentação estão profundamente relacionados a condições graves de saúde e impõem enormes custos a milhões de americanos, além de cidades e estados em todo o país.

Nosso caso trata de empresas que projetaram alimentos para serem prejudiciais e viciantes, e que comercializaram esses produtos com o objetivo de maximizar lucros. Assim como ocorreu com a indústria do tabaco, elas sabiam que seus produtos deixavam as pessoas muito doentes, esconderam essa verdade do público, lucraram bilhões e deixaram os americanos lidarem sozinhos com as consequências.

Ao longo dos anos, o Gabinete do Procurador Municipal de São Francisco responsabilizou indústrias que lucraram enormemente com produtos que sabiam causar danos à saúde de milhões de pessoas — tabaco, tinta com chumbo, opioides. Esta é a nossa próxima luta.

Então, o que são alimentos ultraprocessados? Estamos falando de “comidas” que não são comida de verdade — não são encontradas na natureza e são criadas por meio da combinação de substâncias químicas artificiais com processos industrializados. Aqui vocês podem ver alguns dos piores exemplos.

Embora alimentos ultraprocessados frequentemente tenham alto teor de sódio, açúcar adicionado e gorduras saturadas, os riscos à saúde não se limitam a calorias, gordura ou sal. Esses produtos apresentam riscos únicos por causa dos componentes químicos que contêm, pela forma como esses químicos são combinados e pelos processos usados na sua fabricação.

A indústria criou milhares de novas substâncias que o corpo metaboliza e deseja de maneira diferente. E esses produtos são projetados para serem viciantes — a dependência é uma característica, não uma falha.

Quero compartilhar uma breve história pessoal: quando eu era criança, minha mãe usava Pringles para me convencer a fazer aulas de natação, e até hoje eu adoro Pringles. Mas eles são projetados para serem altamente viciantes.

Nas últimas décadas, essa indústria inundou o abastecimento alimentar dos Estados Unidos. Hoje, os ultraprocessados representam 70% de toda a nossa oferta de alimentos. Não existe ninguém que consiga evitá-los completamente.

E qual é o problema?

Os alimentos ultraprocessados criaram uma enorme crise de saúde pública, com custos de saúde disparando. À medida que o consumo desses produtos aumentou, também aumentaram as doenças crônicas.

Muitos estudos recentes e grandes bases de dados confirmaram a ligação clara entre alimentos ultraprocessados e doenças crônicas, como:

● diabetes tipo 2,

● doença hepática gordurosa,

● doenças cardíacas,

● doenças renais,

● câncer colorretal,

● doença de Crohn,

● depressão.

E o impacto sobre crianças tem sido especialmente alarmante, com níveis inéditos de obesidade e de diabetes tipo 2. Chegamos a um ponto crítico na pesquisa científica sobre os danos desses produtos.

Estudos relevantes têm sido publicados constantemente, confirmando o que já sabemos. Só neste mês, o The Lancet publicou três artigos. No mês passado, o Journal of the American Medical Association também abordou o tema. Há um consenso internacional da comunidade científica, apesar de anos de tentativas da indústria para negar, enganar e, literalmente, pagar cientistas.

Como isso aconteceu?

A indústria do tabaco impulsionou a ascensão dos alimentos ultraprocessados. A partir da década de 1960, as grandes empresas de tabaco passaram a comprar grandes companhias alimentícias.

A R.J. Reynolds comprou a Nabisco e a Del Monte. A Philip Morris comprou a General Foods e a Kraft.

Na década de 1970, a indústria de alimentos se consolidou. Essas empresas então transferiram pessoas, ideias e tecnologia do setor do tabaco para o setor alimentício.

Elas utilizaram as mesmas táticas da Big Tobacco para pesquisar, projetar e vender produtos viciantes — aplicando ciência da adição e técnicas de marketing que seguiram o manual do tabaco, criando a ilusão e a erosão da escolha do consumidor.

No marketing, bombardearam crianças com mensagens e propagandas de produtos, usando mascotes de desenho animado como Tony, o Tigre, Fred Flintstons, até personagens de Patrulha Canina.

Eles utilizaram estratégias de marketing integradas com fabricantes de brinquedos e empresas de mídia voltadas ao público infantil — de Disney e Nickelodeon a Mattel, Nintendo e Marvel. E direcionaram suas campanhas especificamente a comunidades de baixa renda e comunidades racializadas, e às crianças dessas comunidades.

Vale destacar que isso não se limita ao que normalmente pensamos como “junk food”. Muitos alimentos ultraprocessados não parecem prejudiciais, mas são falsamente divulgados como saudáveis.

O aspecto mais condenável de tudo isso é que, assim como as indústrias do tabaco e dos opioides, a indústria dos ultraprocessados tinha conhecimento real de que seus produtos causavam danos.

Em 1999, como consta em nossa denúncia, os CEOs das maiores empresas de alimentos dos Estados Unidos se reuniram. Executivos da Pillsbury e da Kraft alertaram líderes da indústria de que os alimentos ultraprocessados haviam ido longe demais. Eles previram consequências devastadoras para a saúde pública — condições de saúde que custariam ao país 100 bilhões de dólares por ano, um impacto comparável ao do tabaco.

Esses alertas foram ignorados.

Na semana passada, pouco antes do Dia de Ação de Graças, o público soube que um executivo da Campbell’s Soup foi flagrado em uma gravação, durante uma longa conversa, descrevendo seus produtos como “comida altamente processada para pessoas pobres”. Recomendo que vocês ouçam. Essas empresas sabem que seus produtos prejudicam as pessoas, mas continuam a projetá-los, promovê-los e lucrar com eles — especialmente às custas das nossas crianças.

Sobre nossa ação judicial:

As empresas que estamos processando hoje incluem:

● Kraft Heinz

● Mondelēz

● Post Holdings

● Coca-Cola

● Pepsi

● General Mills

● Nestlé USA

● Kellogg’s

● Mars Incorporated

● Conagra Brands

Estamos buscando responsabilizar essas empresas por suas práticas injustas e enganosas, por violarem as leis de concorrência desleal da Califórnia e as leis de incômodo público.

Estamos pedindo uma ordem judicial que proíba o marketing enganoso e buscamos restituição e penalidades civis para recuperar os enormes custos suportados pelos governos — custos de saúde pública diretamente resultantes das doenças crônicas causadas pelos alimentos ultraprocessados.

Nossa dependência de alimentos ultraprocessados foi construída ao longo de décadas. Embora não seja possível reverter esse cenário da noite para o dia, esta ação judicial deve ser o início de um processo de responsabilização.

Temos hoje vários oradores, e quero novamente expressar minha gratidão a todas as pessoas que se reuniram para discutir este tema. Gostaria de apresentar, da Câmara de Supervisores de San Francisco, o Supervisor Shaman Walton, que tem sido uma liderança na área de saúde pública. Ele tem conduzido políticas firmes para impedir que grandes indústrias explorem nossas comunidades — especialmente comunidades racializadas — com produtos prejudiciais. Supervisor.

Supervisor Shaman Walton

Obrigado, Procurador-Geral da Cidade Chiu. Bom dia a todos, e muito obrigado aos nossos profissionais de saúde que estão aqui. Quero reconhecer o Procurador Chiu e sua equipe por ingressarem com esta ação. Como vocês sabem, precisamos fazer tudo o que for possível para proteger nossas comunidades e combater o engano praticado por grandes corporações que têm a intenção de causar prejuízo, especialmente às nossas comunidades mais vulneráveis.

Sabemos que nossas comunidades têm convivido por muito tempo com as consequências dos alimentos ultraprocessados, assim como com outros tipos de ataques. Esses produtos moldaram hábitos alimentares de formas que alimentam doenças crônicas e colocam um peso desproporcional sobre famílias trabalhadoras, bairros de baixa renda e comunidades racializadas.

Quando uma indústria prioriza o lucro acima da saúde pública, o governo tem a responsabilidade de intervir, exigir transparência e proteger seus residentes. Se queremos um sistema alimentar que coloque as pessoas em primeiro lugar, temos que começar pela nossa própria casa. Os departamentos da cidade servem refeições todos os dias — em abrigos, prisões, programas para jovens, serviços de cuidados prolongados e organizações comunitárias. Isso significa que milhares de moradores de São Francisco dependem de nós para refeições que promovam saúde e dignidade, e não para refeições que contribuam para as mesmas condições que estamos tentando combater.

Hoje, apresentaremos uma resolução na reunião da Câmara de Supervisores voltada a identificar onde os alimentos ultraprocessados aparecem dentro dos sistemas da cidade, para que possamos agir com integridade. São Francisco não pode exigir responsabilidade das corporações enquanto ignora os impactos dos alimentos que nós próprios distribuímos.

Enfrentar esse problema na raiz começa com o governo municipal adotando os padrões que queremos ver em todo o país. É assim que avançamos em equidade em saúde, protegemos famílias e garantimos que San Francisco lidere pelo exemplo.

Mais uma vez, quero agradecer ao nosso Procurador da Cidade, David Chiu, por sua liderança e pela coragem de responsabilizar essa indústria. Seu trabalho deixa claro que São Francisco não ficará parada enquanto corporações lucram com produtos que prejudicam nossos residentes.

Este esforço estabelece as bases para proteções mais fortes de saúde pública em todo o estado e reforça a importância de examinarmos nossas próprias práticas. Estou ansioso para trabalhar com o Procurador Chiu à medida que avançamos nesta luta para proteger nossas comunidades. Obrigado novamente a todos por estarem aqui hoje.

Procurador da Cidade Chiu

Obrigado, Supervisor Walton, por sua parceria neste trabalho. São Francisco tem sido líder em avançar questões de saúde pública, e gostaria de chamar nosso próximo orador: o Diretor Municipal de Saúde, Dan Tsai, que já liderou o programa nacional Medicaid no Centro de Serviços Medicare e Medicaid, em Washington. Ele conhece profundamente os custos dos impactos à saúde causados pelos alimentos ultraprocessados nos governos locais, estaduais e federal.

Diretor de Saúde Dan Tsai

Obrigado. Bom dia. Quero agradecer ao Procurador da Cidade por levantar esse tema e ao Supervisor e demais presentes.

A razão pela qual isso é tão importante para nós, no Departamento de Saúde Pública de São Francisco, é que nossa missão central é garantir que São Francisco seja o lugar mais saudável do planeta — não apenas para alguns, mas para todos. E os dados mostram que as principais causas de mortalidade na cidade são doenças cardíacas — em alguns casos, mais até do que overdoses — além de diabetes e outras doenças crônicas relacionadas.

Os impactos e a mortalidade decorrentes dessas doenças afetam de forma desproporcional as comunidades racializadas. Hoje, a expectativa de vida média em São Francisco é de 82 anos. A expectativa de vida média de pessoas negras na cidade é de 66 anos. Isso é inaceitável.

Quando analisamos os fatores que produzem essa diferença — essa lacuna em anos de vida perdidos — vemos que doenças cardíacas, diabetes e condições relacionadas são diretamente responsáveis.

Não acredito que seja possível transformar San Francisco no lugar mais saudável da Terra para todas as pessoas sem também olhar para a alimentação, porque alimentação é saúde. E vocês ouvirão de nossos especialistas, clínicos e pesquisadores — aqui e em todo o país — sobre a forte relação entre os alimentos ultraprocessados, sua natureza viciante e os efeitos posteriores em saúde, mortalidade e outros impactos que mencionei.

Comunidades de baixa renda e comunidades racializadas têm sido desproporcionalmente prejudicadas por tudo isso.

Também quero destacar os custos financeiros e os impactos para o sistema de saúde: até 2031, estima-se que os gastos em saúde chegarão a 7 trilhões de dólares

Grande parte desse custo recai sobre os estados, as cidades e o sistema público de saúde dos Estados Unidos. Entre as obrigações do Medi-Cal, os benefícios de saúde dos servidores públicos e as iniciativas de saúde pública, o Estado da Califórnia e a cidade de São Francisco estão gastando bilhões de dólares por ano com saúde.

Em 2024, o Medi-Cal representou aproximadamente 124 bilhões de dólares em despesas. Cerca de 3,95 bilhões desse valor são atribuídos a São Francisco.

O diabetes foi uma das principais causas de morte e de hospitalização em São Francisco entre 2017 e 2021, e conforme atualizamos esses dados, essa tendência continua — assim como no caso das doenças cardíacas. O diabetes é um fator importante em uma série de internações por doenças cardíacas.

As taxas de hospitalização por diabetes, hipertensão e doenças cardíacas foram substancialmente mais altas em comunidades racializadas e comunidades de baixa renda do que na média geral de São Francisco.

Tudo isso revela um quadro muito claro: para que São Francisco seja o lugar mais saudável do mundo para todas as pessoas, precisamos considerar o peso que isso coloca sobre a saúde pública — o impacto humano e o impacto financeiro sobre o sistema. E, para isso, precisamos olhar para a alimentação, que é um elemento central da saúde. É por isso que eu, e todos nós no departamento, somos muito gratos ao Procurador da Cidade e a todos aqui presentes por assumirem essa questão. Muito obrigado.

Procurador da Cidade

Obrigado, Diretor Tsai, por sua liderança.

No nosso Escritório do Procurador da Cidade de São Francisco, estamos acompanhados nesta ação por três escritórios de advocacia privados de excelência: Andrus Anderson, DiCello Levitt e Morgan & Morgan, todos com ampla experiência em enfrentar indústrias que prejudicam a saúde pública.

Gostaria de convidar dois desses advogados para falar hoje: Fouad Brass, da DiCello Levitt, e Renée Rocha, da Morgan & Morgan.

Fouad Brass (DiCello Levitt)

Obrigado, Procurador da Cidade. Boa tarde a todos.

É realmente uma honra estarmos ao lado do Procurador e dos advogados de São Francisco — Yvonne Mayer, Sarah Eisenberg, Ronald Lee e Jesse Lanier. É preciso muita coragem para tomar a decisão de avançar e enfrentar uma crise dessa magnitude para a cidade de San Francisco, estabelecendo um exemplo para pessoas em todo o país.

Este caso é profundamente pessoal. Philip Morris e RJ Reynolds — as maiores empresas do setor de tabaco, responsáveis por disseminar tabaco e câncer em nossas comunidades — decidiram utilizar a mesma tecnologia, todo o seu dinheiro e toda a sua astúcia para aplicar essa mesma ciência na criação de um novo tipo de “quase alimento”, que é o que são os UPFs, ou alimentos ultraprocessados.

Tudo isso foi feito sem o conhecimento do público, em segredo. O tabaco sequestrou nosso sistema alimentar por décadas.

Durante esse período, utilizaram técnicas psicológicas e de marketing — as mesmas desenvolvidas para promover e vender cigarros — para fabricar e vender alimentos ultraprocessados aos cidadãos de São Francisco, com foco especial em comercializar esses produtos para crianças.

A grande indústria do tabaco, agora atuando como grande indústria alimentícia, fez tudo isso com um único objetivo: transformar alimentos ultraprocessados em um pilar da dieta americana, apesar de ter plena ciência dos danos reais à saúde e dos prejuízos sociais que esses produtos causam.

Elas estavam tão focadas em lucrar que fizeram isso consciente e deliberadamente, colocando a saúde das pessoas de São Francisco — e dos americanos em geral — em risco extremo.

Todos nós já fomos ao supermercado acreditando que estávamos comprando comida da forma como entendemos comida há milhares de anos. Mas, na realidade, estávamos adquirindo alimentos ultraprocessados sem saber.

Confiamos, de forma razoável, nas graves distorções e mentiras dos réus, que apresentaram esses produtos como comida — muitas vezes como comida conveniente e, em vários casos, como comida saudável.

Agora sabemos que essas afirmações não eram verdadeiras. Esses produtos tão comuns — balas em formato de fruta (“gummy fruit snacks”), Pop-Tarts, Hot Pockets, refeições prontas e produtos de queijo líquido — alteram o funcionamento do corpo de nossas crianças processar alimentos — e essas mudanças fisiológicas foram planejadas, com efeitos devastadores para as pessoas e as crianças de São Francisco.

Como vocês ouvirão em breve, minha colega Renée Rocha fornecerá contexto adicional sobre os UPFs. Somos profundamente gratos por estar ao lado do Procurador da Cidade e do povo de São Francisco ao tomar uma atitude histórica, em um caso histórico, que mudará o futuro de nossos filhos e netos. Muito obrigado.

Renée Rocha (Morgan & Morgan)

Obrigada.

Embora hoje estejam por toda parte, os UPFs não existem há muito tempo. Eles são novos — e estranhos ao nosso organismo. E a ciência é inegável: alimentos ultraprocessados causam diabetes tipo 2 em crianças. Essa doença simplesmente não existia em crianças antes da invenção dos alimentos ultraprocessados.

Esses produtos estão impulsionando a crise de obesidade em São Francisco, na Califórnia e em todo os Estados Unidos. Estão também impulsionando doenças cardiovasculares e mortes precoces.

Como alegamos na nossa ação, os réus — incluindo empresas de alimentos que foram propriedade de companhias de tabaco, como Kraft Heinz, Mondelēz e Post Holdings — criaram conscientemente produtos perigosos e viciantes. Alegamos igualmente que eles esconderam a verdade de forma persistente e mentiram sobre os efeitos desses produtos.

Eles causaram um incômodo público e uma crise de saúde pública em São Francisco e além. E hoje, a cidade de São Francisco e o povo soberano da Califórnia se levantam e dizem: basta.

É hora de responsabilização e justiça. É hora de criar um futuro mais saudável para nossas crianças — um futuro com alimentos que nutrem, em vez de prejudicar.

Hoje marca um grande marco na história da saúde pública, e estamos confiantes de que São Francisco e o povo da Califórnia podem nos guiar para uma nova e melhor era. Agradecemos sua coragem e temos a honra de trabalhar em seu nome. Obrigada.

Procurador da Cidade

Obrigado.

Nossa última oradora hoje vem da comunidade médica. Em São Francisco, nós seguimos os fatos, seguimos a ciência — e certamente ouvimos nossos médicos.

Temos aqui diversos representantes da área médica, e quero agradecer:

● Dra. Sarita Sanpathy, clínica geral;

● Dr. John Ma, cirurgião;

● E convidar a Dra. Kim Newell Green, professora clínica associada da UCSF, para discutir os danos desses produtos, danos que ela testemunhou ao longo de toda sua carreira como médica.

Dra. Kim Newell Green (UCSF)

Bom dia, e muito obrigada, Procurador-Geral e Procurador da Cidade.

Meu nome é Dra. Kim Newell Green. Sou ex-presidente da Sociedade Médica de São Francisco e Marin, e sou também membro do conselho da Associação Médica da Califórnia. Mas estou aqui hoje falando como pediatra — e como mãe.

E eu estou aterrorizada com o que os alimentos ultraprocessados estão fazendo — e já fizeram — com nossas crianças e nossas famílias.

Eu vejo todos os dias o impacto direto que esses produtos têm sobre nossos pacientes, nossas crianças e todas as nossas famílias. Pesquisas mostram que hoje esses alimentos representam quase 70% das calorias consumidas na dieta das crianças nos Estados Unidos.

Isso significa que a maior parte do que nossos filhos comem sequer se parece com alimentos ricos em nutrientes — como frutas, vegetais e proteínas magras — que são essenciais para o crescimento e para o desenvolvimento cerebral.

Os adultos consomem mais de 50% das calorias provenientes desses UPFs. Pesquisas cada vez mais numerosas — como vocês ouviram aqui — vêm relacionando esses alimentos ultraprocessados a doenças graves. Já falamos sobre obesidade, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e até mesmo saúde mental e função cognitiva, afetando condições como depressão e TDAH.

Tenho visto o aumento contínuo e implacável dessas condições em crianças cada vez mais jovens na minha prática. Eu luto contra isso todos os dias na minha própria casa — e estou perdendo — porque esses alimentos são extremamente atraentes e viciantes para as crianças.

E isso não se resume a pedir que meus filhos ou meus pacientes façam “melhores escolhas”. Marketing agressivo, baixo custo e facilidade de acesso tornam os ultraprocessados a opção padrão para muitas famílias, especialmente em comunidades em situação de vulnerabilidade e pouco representadas.

As consequências são profundas: taxas mais altas de doenças crônicas, pior desempenho escolar e custos de saúde de longo prazo que recaem sobre nossa cidade, nosso estado e nosso país.

Precisamos agir. E sou muito grata por estar aqui ao lado deste grupo. Assim como aconteceu nas vitórias jurídicas contra a indústria do tabaco e contra a indústria de bebidas açucaradas, a ação de hoje é um passo fundamental para responsabilizar empresas que lucram com produtos que colocam nossa saúde em risco. Vamos impedir que essas companhias continuem envenenando nossas crianças e nossas famílias. Obrigada.

Procurador da Cidade

Obrigado, doutora.

Ao concluirmos — e antes de abrirmos para perguntas — quero agradecer aos profissionais extraordinários do meu gabinete pelo trabalho: Jesse Lanier, Ron Lee, Sarah Eisenberg, Yvonne Murray e outros.

E acabei de notar que alguém deixou aqui a minha lata favorita de Pringles, em uma prateleira aleatória. Como mencionei antes, quando eu era criança, minha mãe costumava me subornar com Pringles para me fazer entrar na piscina e fazer aulas de natação. Ainda tenho vontade de comer até hoje. Mas, nos últimos meses, aprendi sobre os danos específicos desse produto, que têm sido amplamente documentados.

Dito isso… alguém quer? Podem levar. Estamos felizes em responder perguntas.

Pergunta da imprensa

Por que agora? Por que mover esta ação neste momento?

Procurador da Cidade

Por alguns motivos. Primeiro, e acima de tudo: a ciência realmente virou a chave aqui. Há estudos há muitos anos, mas agora todos os grandes conjuntos de dados — estudos do mundo inteiro — mostram claramente a ligação entre os ultraprocessados e todos os impactos devastadores na saúde pública de que falamos: câncer, doenças crônicas, impactos metabólicos. Quase todo mês surge um novo estudo, de uma revista médica respeitável, reforçando essa relação.

Agora já são muitos, muitos estudos. Os dados são irrefutáveis.

Pergunta da imprensa

Mas e a falta de uma definição universal de “alimento ultraprocessado”? A indústria argumenta isso…

Procurador da Cidade

Sim, ouvimos isso da indústria. Eles gostam de discutir se existe ou não uma definição exata. Mas há um entendimento muito claro sobre o que são alimentos ultraprocessados — e vamos detalhar isso no processo.

O que sabemos é que existe uma categoria inteira de produtos que corresponde a

70% do suprimento alimentar americano, e essa categoria está adoecendo a população. É isso que importa aqui.

Existem definições reconhecidas, inclusive mencionadas na nossa denúncia, e estamos ansiosos para discutir isso em tribunal.

Pergunta da imprensa

E quanto aos preços? As famílias precisam de alimentos acessíveis. É possível oferecer alternativas saudáveis e baratas?

Procurador da Cidade

Em primeiro lugar: absolutamente. Há inúmeros exemplos de alimentos acessíveis que não são ultraprocessados.

Mas eu diria o seguinte: diabetes é inacessível. Doença cardíaca é inacessível. Obesidade é inacessível.

Essas indústrias estão vendendo produtos que tornaram milhões de americanos dependentes.

Elas estão levando as pessoas à dependência e gerando custos de longo prazo que são absolutamente impossíveis de suportar para todos nós — e também para governos municipais e estaduais em todo o país.

Não há nada neste processo que vise proibir qualquer produto, mas, na nossa visão, esta é uma indústria envolvida em publicidade altamente enganosa. Então, certamente buscamos enfrentar essa publicidade e garantir responsabilidade por parte das indústrias que criaram custos enormes para a sociedade, para os sistemas de saúde pública e para seres humanos. Portanto, vamos buscar responsabilização por esses custos.

Mais alguém?

Com certeza, buscaremos compensação financeira.

Alguma pergunta final? Caso não, temos várias pessoas aqui que estão disponíveis para entrevistas. E, com isso, quero novamente agradecer a todos que estão conosco e aos que trabalharam no protocolo deste processo. Essa história continuará. Muito obrigado.