Guia para cozinhar para quem precisa
Por Alimentação Saudável - 07 de junho de 2021
Hoje, no Brasil, mais da metade da população está em situação de insegurança alimentar, a falta de acesso pleno e permanente a alimentos. Fazia 17 anos que o país não atingia essa marca: 116 milhões de pessoas não têm certeza se terão o que comer no dia seguinte e 19 milhões de brasileiros estão em insegurança alimentar grave, ou seja, passando fome.
Entre nossos seguidores, muita gente manifesta vontade de ajudar, mas não sabe como fazer. Para dar uma força, organizamos um guia.
Visite a página Cozinhe para quem precisa
Como começar
Para se preparar, antes mesmo de entrar na cozinha, entrevistamos Sil Strass e Rute Corrêa de Souza, do projeto O Amor Agradece, que distribui marmitas em São Paulo.
Como fazer a marmita chegar a quem precisa.
Você pode se conectar a uma iniciativa que já tenha uma rede de distribuição. Há muitas espalhadas pelo Brasil. Você também pode criar o seu grupo. Parece complicado, mas não é.
1 - Onde estão as pessoas, quantas são? Ao circular pela cidade, observe onde estão pessoas em situação de rua e faça uma estimativa de quantas são.
2 - Quantas marmitas você consegue cozinhar? Avalie quantas marmitas você consegue fazer.
3 - Vizinhos também podem querer cozinhar. Chame os amigos que têm carro e estejam a fim de ajudar e pergunte a amigos e vizinhos se eles também podem cozinhar, para aumentar o volume de marmitas.
4 - Tudo combinado. Crie um grupo de Whatsapp para compartilhar o trajeto de retirada e entrega das marmitas. O ideal é que o carro saia com um roteiro pensado.
4 - Máscara, álcool gel e roteiro na mão. Na hora de distribuir, o piloto segue o roteiro e o co-piloto faz as entregas. Pode ser pela janela do carro. Não esqueça: máscara e álcool gel, para proteger você e os outros.
Quanto cozinhar?
É sempre bom pensar que a marmita vai ser sustento para um dia inteiro. Muitas vezes as pessoas não comeram ontem e nem vão comer amanhã. Arroz, feijão, hortaliças e carne garantem uma refeição completa. As porções devem ser grandes. A sugestão é de cerca de 500 g.
Quais os erros mais comuns?
Usar produtos ultraprocessados. Colocar pedaços grandes de carne ou legume é outro erro comum. Preparar alimentos macios e em pedaços que caibam em uma colher faz bastante diferença para quem recebe essa refeição.
Precisa mandar algo além da marmita?
É legal mandar uma colher descartável (que é mais resistente do que o garfo) e uma garrafinha de água. O ideal é que a comida dispense o uso de faca, é muito difícil cortar com faca descartável sobre a marmita. Guardanapo é desnecessário.
O que cozinhar
Para organizar essa cozinhança, escalamos a Carol Stamillo, chef da cozinha do Panelinha.
Cardápio: pê-efe na marmita
A estrutura do pê-efe é ideal para garantir que a pessoa que vai receber a marmita tenha uma refeição completa e equilibrada. Arroz e feijão são preparos que rendem bem. E é fácil estruturar a marmita usando a lógica arroz, feijão, duas hortaliças e um pedaço de carne (se tiver). Além disso, é uma comida segue o nosso padrão alimentar tradicional, é saudável e todo mundo gosta.
Dica: você pode incluir legumes já no preparo do arroz e do feijão, assim aumenta a oferta de hortaliças da marmita.
Escolha comidas que viajem bem
Na hora de pensar nas hortaliças, saladas de folha ou tomate cru temperado murcham e entregam rápido. É melhor mandar preparos com legumes refogados ou cozidos ou folhas maceradas (como repolho, que rende bem). Para as carnes, os ensopados e cozidos com molho de tomate são a maneira mais garantida que fazer chegar a quem precisa uma carne que esteja macia e gostosa (e não ressecada). Frango assado também é uma opção. Farofas também rendem bem, incluem hortaliças e podem complear o pê-efe.
Na página Cozinhe para quem precisa tem seleção de receitas.
Evite preparos que estraguem rápido
Carnes mal passadas, saladas de folha ou tomate tomate cru temperado, saladas de folhas, preparos que levem leite ou iogurte e peixes no geral (a exceção é sardinha e atum em conserva). Prefira ensopados, saladas de legumes refogados ou cozidos ou folhas maceradas (como repolho).
Como cozinhar em grandes quantidades?
Primeira coisa a se ter em mente: ao aumentar a quantidade das receitas lembre-se de aumentar o tamanho da panela e o tamanho da boca de fogão.
Avalie a realidade da sua cozinha, é melhor fazer duas panelas grandes de ragu em bocas grandes do fogão do que colocar uma panela gigante, daquelas industriais, em uma boca de fogão caseira.
Planeje diferentes tipos de cozimento: assim você otimiza o tempo, as bocas do fogão, o gás e o tempo de forno. Exemplo: frango assado + arroz + feijão + salada de repolho com cenoura.
Como aumentar as receitas do Panelinha?
Você pode multiplicar os ingredientes principais das receitas, mas nunca deve multiplicar igualmente: sal, especiarias, ervas, água e outros líquidos. Para esses, vá checando ao longo do cozimento a quantidade necessária.
No caso dos legumes aromáticos, como cebola e alho, também não precisa multiplicar. Em vez de multiplicar, por exemplo, por 2, pode multiplicar por 1,5.
Adapte receitas
Algumas receitas muito boas para mandar na marmita levam vinho ou cachaça, é o caso do pernil na panela de pressão ou da carne de panela desfiada. Nesses casos, troque por água. Além de encarecer a receita, esses ingredientes podem ser uma questão para a saúde de quem recebe a marmita. Você também pode pensar em substituições para ingredientes que sejam mais caros. Por exemplo, a omelete de forno de alho-poró fica uma delícia preparada com cebola.
Como porcionar
O jeito mais fácil de porcionar comida em grande quantidade para muitas marmitas é usar uma medida específica para cada receita. Se tiver dificuldade monte um prato de referência para checar antes de estabelecer a medida. Exemplo: para o arroz, 2 colheres de servir arroz/ou a colher grande da minha casa; para o feijão: 2 conchas e assim por diante.
Perguntamos para a Sil como é a reação de quem recebe essas marmitas.
"As pessoas que recebem agradecem muito, sempre. Falam de amor e mandam bênçãos a toda a rede envolvida no trabalho. Mas o que mais chama atenção é a solidariedade. As pessoas em situação de insegurança alimentar nunca pedem comida 'pra depois', elas pedem mais uma marmita pensando em outra pessoa que também pode comer."
Não consegue cozinhar, mas quer ajudar?
Você pode também doar alimento ou dinheiro para organizações que cozinham e distribuem alimentos. A doação em dinheiro é importante para manter os projetos em pé.