Peixe fora d'água

Peixe fora d'água
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Por Rita Lobo - 14 de abril de 2008


De repente, só ouço falar em autonomia. Minha filha, Dora, tem apenas 3 anos. Mas desde a primeira reunião de pais e mestres na escola, autonomia é palavra-chave. Autonomia para cá, autonomia para lá. E, confesso que, no começo, fiquei um pouco chocada. Gabriel vai fazer 6 anos. Tudo bem. Autonomia é mais que bem-vinda. Mas será que esse tanto de autonomia para um criança de 3 anos é mesmo positiva?

Deve ser. Então, nós, pais, aprendemos na escola que devemos incentivar que os filhos façam tudo o que eles podem sozinhos: comer, tomar banho, se secar, se trocar... E eles também são ensinados que só devem pedir ajuda em última instância.

E, de fato, é muito bom para os pais não ter que dar comida na boca dos filhos, especialmente no domingo à noite, depois de uma tarde correndo no parque. O que acontece com a energia dessas crianças que, simplesmente, não acaba? Eu sempre fico sem saber o fim da história dos livrinhos que leio para eles. Muito antes da última página eu já estou dormindo.

Mas back to the cold cow (lembra daquele livro que traduzia expressões intraduzíveis?), autonomia, às vezes, também pode ser um problema. Dora não aceita mais ajuda para se vestir. O problema é que ela ainda não sabe se vestir. E não estou me referindo à combinação de cores, estilos, e de forma alguma estou insinuando que minha filha não tenha gosto! Muito pelo contrário. Ela escolhe sempre roupas fofas e nunca corre o risco de errar: tudo é rosa, e se não for, ela não usa.

A questão aqui é que são 10 minutos para colocar a meia, mais 10 para colocar a calça, uns 20 para vestir a blusa. Até que ela lembra que blusa é o item mais difícil e aprendeu que pode pedir ajuda. E lá se foram aqueles 40 minutos que nós duas poderíamos usar para dormir mais um pouquinho pela manhã... E, de qualquer maneira, não conheço ninguém com a minha idade que não consiga se trocar sozinho. Precisa aprender tudo com 3 anos?

Está bem, vou contar a verdade: eu adoro dar banho nos meus filhos, secá-los, trocá-los, dormir com eles na minha cama. Vivo reclamando que eles não querem voltar para a minha barriga, brinco que eles são bebezinhos e, de vez em quando, ainda canto nana neném na hora de dormir. Mas não teria coragem de falar isso a menos de dez quarteirões da escola. Estou me sentindo uma mãe autônoma. Um peixe nadando contra a maré.