Dia das Crianças com crianças na cozinha
Por Rita Lobo - 11 de outubro de 2016
Nesses vinte anos escrevendo receitas, ficou claro para mim que tem um momento na vida, uma espécie de portal, que faz com que as pessoas queiram aprender a cozinhar – caso elas nunca tenham se interessado antes. É o nascimento de um filho.
Para o filho você quer tudo saboroso, fresco, caseiro, saudável; de preferência, orgânico. Um tempinho depois pode aparecer uma questão comum: ai, ai, ai, meu filho não gosta de nada, meu filho não come fruta, meu filho não quer salada, só quer batata frita… Como faço para ele comer melhor? É uma agonia.
Essa pergunta sempre me faz pensar: certo, mas e você, gosta de comida? Come fruta? Se serve da salada que coloca na mesa? Mais: comida é um assunto na sua casa? A refeição é um momento de prazer ou só de briga? Você cozinha com alegria ou é só obrigação?
Tenho a impressão de que quanto mais o assunto comida é encarado com leveza e entusiasmo, melhor a relação das crianças com a alimentação. São frases simples, como “olha que incrível essa abóbora assada!”, “adoro arroz, feijão e farofa!” ou o que quer que faça o seu coração bater mais forte quando o assunto é comida. Falar dela é importante.
Mas... É verdade (e sei bem, acredite em mim) que você pode amar cozinhar, cozinhar com prazer, ter um monte de frutas frescas na cozinha e… E seu filho simplesmente não se interessar por comida. Acontece. Tenho dois filhos, um adora; outro não tá nem aí. A gente pode se esforçar o que for e, não adianta, é uma questão de personalidade. Mas isso não significa que a gente pode deixar de fazer nossa parte, e a gente tem que fazer de tudo. Minha avó dizia: um hora reverte.
Aqui no Panelinha, nossos princípios, quando o assunto é criança, são dois:
1. Queremos as crianças na cozinha, porque cozinhar é como ler e escrever: a gente não nasce sabendo, mas é totalmente capaz de aprender (e não para de ler e escrever nunca mais). A criança que vai se familiarizando com a cozinha aprende fácil e tem grandes chances de manter uma alimentação saudável de verdade a vida inteira.
2. Não existe comida de criança e comida de adulto. Existe comida de verdade e imitação de comida – comprada pronta, feita na fábrica, cheia de aditivos químicos. E comida de verdade é para adulto e para criança.
Tenho certeza de que não existe uma fórmula para fazer criança comer bem. Mas uma coisa é certa: numa casa com comida de verdade, as chances são maiores. Cada alimento que você oferece para uma criança, cada receita, cada ingrediente, é um convite àquele paladar em formação. É uma descoberta. É educação alimentar. Ela não precisa gostar de primeira, mas pode se interessar na quarta ou quinta vez que o item aparecer na mesa. Mais difícil do que se render ao nuggets? Com certeza. Porém, mais fácil do que tentar tirar do cardápio os ultraprocessados salgados e supertemperados depois que eles foram apresentados aos pequenos.
Assista aqui ao curso Comida de Verdade, uma parceria do Panelinha com a USP, apresentado por mim e pelo professor Carlos Monteiro, coordenador do Guia Alimentar para a População Brasileira. São 10 aulas que explicam os conceitos de uma alimentação saudável [de verdade] e ensinam como colocá-la em prática no dia a dia.
No curso, você vai ver que alimentação saudável não tem nada a ver com dieta. Tem a ver, e muito, com a cozinha, com cozinhar. O importante, no fim das contas, é comer comida de verdade, caseira. Pode ser arroz, feijão e bife todo dia. Agora, fica melhor ainda se você conseguir incluir um pouco de variação. Inclua brócolis e... Ah, seu filho não gosta de brócolis cozido? Experimente assar. Ele não come nada verde? Que tal preparar chips de couve? O drama aí é com frutas? Será que ele não come nem se for uma panqueca de banana ou uma fatia de abacaxi grelhado com raspinhas de limão? E se ele preparar o alimento dele como se fosse uma brincadeira?
Que a situação vai se reverter, ela vai. Mas a gente pode dar uma forcinha para que isso aconteça o quanto antes.
Foto: Editora Panelinha / Ricardo Toscani