A década na cozinha
Por Rita Lobo - 29 de dezembro de 2010
Saí uma semana de férias mas quem realmente ficou renovado foi o blog. Fotos maiores, botões para adicionar posts à sua página aqui no Panelinha e também às redes sociais. Para estrear de um jeito cor-de-rosa, escolhi essas fotos na cozinha da casa onde ficamos na praia. (Estávamos preparando rabanadas para o café da manhã do dia 25.) Mas assunto vai ser outro. Apesar de ter a ver com cozinhar, com comer e até beber, não tem nada a ver com minha semana na praia!
O ano está chegando ao fim e, em vez de fazer uma retrospectiva de 2010, fiquei com vontade de listar as principais mudanças da década na cozinha. Tentei destacar os 10 pontos que, acredito, influenciaram e vão continuar influenciando a nossa maneira de cozinhar e de comer. Além de usar a minha experiência pessoal na cozinha, levei em consideração o que os leitores vêm me contado nesses 10 anos do Panelinha, seja por e-mail ou escrevendo nas páginas da comunidade.
Apesar das novas possibilidades, como curtir, twitar ou adicionar este post à sua página no Panelinha, o meu e-mail continua firme e forte para quem quiser se comunicar diretamente comigo. Os meus cabelos estão sempre mudando, mas o meu endereço eletrônico continua o mesmo: rita@panelinha.com.br. Aproveito para desejar que 2011 seja muito saboroso, em todos os sentidos!
1. Comer não é um ato isolado, mesmo quando você está sozinho
Os movimentos verdes apontam para a necessidade de olhar não só para a alimento mas para o produtor, o transporte, o preparo e, consequentemente, para o planeta. E nós passamos a notar que muita coisa acontece até a comida chegar ao prato. E também quando ela vai para o lixo. As questões ligadas à sustentabilidade já mudaram e vão mudar ainda mais a maneira como compramos, armazenamos, preparamos e até jogamos fora os alimentos. A percepção de que a alimentação tem ser boa para o indivíduo e também para o planeta foi uma das grandes mudanças da década.
2. Comida caseira não é nem trivial nem simples
Cozinhar ficou complicado. Falta de tempo e falta de prática são as duas principais queixas. Com toda a oferta de comida pronta à venda, fazer o próprio alimento ganhou ares de glamour. Seja comfort food, “comida de alma” (termo cunhado pela minha musa Nina Horta) ou o nome que se queira dar, arroz com feijão virou até inspiração para grandes chefs. (Já experimentou a feijoada reinventada pela Helena Rizzo?) Já nas cozinhas domésticas, fixou-se a noção de que uma comida feita em casa nutre além do corpo. Fazer e comer uma omelete é melhor do que esquentar no micro-ondas uma lasanha comprada congelada. A alimentação caseira cotidiana ficou mais simples, mais prática e menos rígida, sem a necessidade de ter entrada, prato principal, dois acompanhamentos, sobremesa e café para ser uma boa refeição.
3. As dietas que excluem tipos de alimentos ficaram de fora
Comemos de acordo com um padrão comportamental e excluir um tipo de alimento, seja carboidrato ou gordura, no longo prazo não é uma solução para emagrecer. A reeducação alimentar tomou lugar dos regiminhos. Nenhum alimento é bom ou ruim por si só. O que importa é a combinação deles e comer comida de verdade.
4. A funcionalidade dos alimentos entrou na balança
Se na década anterior o que pesava era a soma das calorias, nesta, o que importa é para que servem os alimentos. Semente de linhaça, aveia, castanha-do-brasil, chá verde, são muitos os ingredientes que passaram a entrar no cardápio, nem sempre pelo sabor, mas por serem alimentos funcionais. Pessoalmente, não sei bem no que vai dar, mas já é bem melhor do que ficar calculando as calorias antes de comer.
5. A cozinha saiu da senzala
Nos apartamentos antigos, por maior que seja a cozinha, ela está sempre no pior lugar da casa – o que tem menos iluminação e ventilação natural. Nesta década, as cozinhas invadiram a sala e tomaram o lugar do salão de festas dos prédios, as tais cozinhas gourmets. E as que continuaram no mesmo lugar ganharam o respeito dos moradores da casa. O cozinhar em família aparece como alternativa ao jantar em família, que está em extinção.
6. Em busca da nacionalidade perdida
Comida brasileira ganhou a atenção dos chefs e dos gourmets, e a caça aos ingredientes brasileiros “inéditos” começou. Se antes era preciso adaptar receitas estrangeiras com ingredientes brasileiros, agora o que se quer é achar a receita ideal para os produtos nacionais. Logo mais, em vez de ver macarrão instantâneo sabor funghi, vamos ver “sabor cogumelos da Amazônia”, ou qualquer coisa assim. O lado bom é que vão surgir muitas receitas e novos usos para mandiocas, abóboras, chuchus, quiabos e feijões.
7. O mundo aos seus pés, opa!, à mão
Macarrão italiano, queijo francês, presunto espanhol, azeite português, saquê japonês, bons produtos de todos os cantos são encontrados até nas redes de supermercados. Já estamos tão acostumados a isso que nem parece uma grande mudança, mas não faz muito tempo nem grano duro havia no mercado.
8. Vinho nosso de cada dia
Nesta década, vinho definitivamente deixou de ser bebida exclusiva de comemorações. Os supermercados estão lotados de garrafas, as adegas domésticas são vendidas pelos mesmos fabricantes de geladeiras e o vinho espumante brasileiro encontrou seu lugar ao sol.
9. Café e chocolate a preço de ouro
O nosso paladar está mais educado, mais exigente. Ele não aceita qualquer coisa, como o antigo cafezinho brasileiro, muito ácido, com milho misturado ao pó para render mais. Nós estamos gastando mais com itens que antes eram “cortesia da casa”. A mesma coisa aconteceu com o chocolate. Os dois alimentos caíram nas graças do mundo gourmet e produtos de excelente qualidade surgiram no mercado.
10. Comida virou assunto
Trocar receita era assunto de mulher desocupada. Cozinhar era coisa de mulher que não trabalha. Em uma década, chefs viraram estrelas de televisão, gourmets viraram blogueiros, e fotografar o prato antes de comer virou mania. Tirando os exageros do modismo, parece que comida virou um assunto que veio para ficar. Tomara!